Em 2020, foram registrados 7.328 crimes na Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM), localizada em Campo Grande. Desses, 5.755 são casos de violência doméstica contra mulheres. Dentro desta estatística, está uma mãe que além de sofrer agressões, perdeu a guarda dos filhos para o ex marido.
Em entrevista para o Correio do Estado, ela revela que se separou há cerca de 4 anos, mas ainda sofre com violências psicológicas e verbais. Ela já registrou 10 boletins de ocorrência contra o ex marido, que, atualmente, usa tornozeleira eletrônica por descumprimento de medida protetiva.
O caso dela não é isolado, no ano passado houve ainda 407 queixas de estupros; 86 de importunação sexual; 14 de feminicídio tentado; 11 de feminicídio consumado e outros, que representam 1.055. Os dados são da DEAM e Subsecretarias de Políticas para a Mulher (SEMU).
História de agressão física, psicológica, verbal, mental, patrimonial e econômica
“Vivia em um relacionamento abusivo, sofria agressão física, verbal e psicológica, era ameaçada, perseguida e humilhada na frente de qualquer pessoa”, revela.
A mulher tem quatro filhos e o agressor é pai de dois deles. Ainda quando estava grávida do segundo filho, decidiu se separar devido às condições abusivas que sofria.
A partir de então, o ex marido não aceita o término do relacionamento até hoje, e também não permite que sua ex esposa se relacione com outras pessoas.
“Ele não aceitava que eu me relacionasse com ninguém até que as crianças crescessem. Continuava me perseguindo e já invadiu minha casa por 3 vezes. O único desejo dele é se vingar, usando o vínculo que ele tem comigo, os filhos, pois não aceita a separação”, revela.
Após 3 anos separada, a vítima iniciou outro relacionamento, o qual o ex marido também ameaça e agride. “Ele tentou matar meu atual companheiro com golpes na cabeça e no rosto”, relata.
“E ainda começou a incomodar por mensagens, dizendo que iria expor fotos minhas para o meu atual companheiro”, complementa.
Até sem bens materiais, como geladeira, fogão e máquina de lavar, a vítima ficou. Ela conta que depois desse episódio, ele não a permitiu mais que tivesse contato com seus filhos.
De acordo com a mulher, até então a guarda era compartilhada e ela sempre permitiu que ele se comunicasse com as crianças.
O agressor fez de tudo para que a mulher não ficasse com os filhos, tanto que atualmente, a guarda unilateral provisória está com ele.
A justiça alegou que a mulher não poderia ficar com a tutela, pois poderia ir embora com as crianças, já que não tem família em Mato Grosso do Sul.
A vítima contou que quando sua guarda legal foi retirada, um oficial de justiça, o advogado do ex marido e mais dois policiais foram até a casa dela para levarem as crianças de forma agressiva. Contudo, ela não registrou nenhuma queixa a respeito desse episódio.
Desde então, ela pode buscar as crianças na casa da ex sogra nas terças, quintas, sábados e domingos alternados, sem pernoite, ou seja, os filhos não podem dormir na casa dela.
A vítima recebeu apoio e suporte da DEAM e Casa da Mulher Brasileira (CMB). “A assistente social chegou a me alertar dizendo para evitar qualquer contato com o agressor, pois ele nunca iria aceitar eu me relacionar com ninguém, que eu sendo nova provavelmente iria conhecer alguém e me casar”, testemunha.
Ela enaltece o trabalho feito pelas instituições. “Um atendimento de excelência as mulheres nessas condições. Gratidão”, elogia.
Casa da Mulher Brasileira
A Casa da Mulher Brasileira (CMB) comemorou ontem (3) seus 6 anos. Adriane Lopes, vice-prefeita de Campo Grande, celebra o aniversário da Casa.
Está localizada na região do Aeroporto Internacional de Campo Grande, na rua Brasília, Jardim Imá.
Seu objetivo é valorizar o público feminino e enfrentar todas as formas de violência contra a mulher.
“É uma conquista para a cidade. É a primeira casa do país e é exemplo após 6 anos, razão porque é não é apenas um trabalho coletivo, mas de toda a sociedade”, diz Marcos Trad, prefeito da capital.
De 2017 a 2020, 24.898 mulheres foram atendidas em algum dos vários setores da Casa da Mulher. As que apresentaram retorno totalizam em 58.688.
As que foram encaminhadas para alguma rede de serviço externa como Secretaria Municipal de Saúde (SESAU), Secretaria de Assistência Social (SAS), Centro de Referência da Saúde da Mulher (CEAM), Casa Abrigo, Instituto de Medicina e Odontologia Legal (IMOL), entre outros, são 445.404.
A maioria das mulheres atendidas (29%) possuem entre 21 e 30 anos. Em seguida, o percentual de 28,9%, compreende o público feminino de 41 a 60 anos. Percentual de 27,7% são mulheres de 31 a 40 anos.
Idosas acima de 80 anos representam 6%. Meninas de 18 a 20 anos, 3,5%. Menores de idade são 2,9%, e, garotas sem data de nascimento, totalizam em 1,5%.
As que possuem ensino médio completo representam 29%. Já as que não concluíram o ensino fundamental, 23% e as que não concluíram o ensino médio, 16,5%.
O restante terminou ou não a faculdade, possui o fundamental completo ou não possui nenhuma escolaridade.
Mais da metade de mulheres atendidas na CMB são da cor parda.
A delegada Fernanda Felix Carvalho Mendes informou ao Correio do Estado que a Lei Maria da Penha está condenando os agressores e também está mudando o comportamento de todo o Brasil.
“Com a Lei Maria da Penha as denúncias aumentaram, e por conseguinte as condenações surgem já no Poder Judiciário desde 2016”, afirma.
“Os equipamentos de segurança pública contribuem muito com isso, porque a Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher é a principal porta de entrada para a mulher vítima de violência doméstica”, finaliza.
Pandemia X violência contra a mulher
Desde a criação da Lei do Feminicídio, em 2015, nunca houve tanta matança de tantas mulheres como ocorreu em 2020.
Campo Grande teve um aumento de 120% de mulheres mortas vítimas de feminicídio em 2020 em relação a 2019. No interior do Estado, esse número é de 30%.
Porém, o número de atendimentos na recepção da Casa da Mulher Brasileira caiu consideravelmente e isso se deve ao maior tempo da mulher dentro de casa perto de agressores: consequência da pandemia do novo coronavírus.
Em março de 2020, início da pandemia no Estado, foram registrados 1.270 suportes à mulher. Já no mês seguinte esse número despencou para 775 atendimentos.
A partir de maio, esse número manteve-se abaixo de mil atendimentos mensais em praticamente todos os outros meses, até dezembro, bem diferente de outros anos (2017, 2018 e 2019), quando o número de assistências mensais geralmente é acima de 1,2 mil.
Durante os primeiros meses da pandemia, os números de boletins de ocorrência registrados foram decrescendo a cada mês. Em fevereiro, foram 654 denúncias. Já em março, esse número caiu para 603.
Em abril, passou para 549 e maio para 547. No ano de 2019, essas estatísticas eram bem diferentes: se mantinham acima de 589 queixas registradas mensalmente.
No ano passado, maio, ainda início da pandemia, foi o período em que menos medidas protetivas foram concedidas ao público feminino.
Já julho, outubro e novembro são os meses em que houve mais medidas protetivas concedidas às vítimas, em relação a 2017, 2018 e 2019.
Os dados são da DEAM e Subsecretarias de Políticas para a Mulher (SEMU).
Fonte: Correio do Estado